sábado, 3 de novembro de 2007

FERNANDO MEIRELLES BROCA




Em cinema, métodos diferentes são o resultado de diferentes escalas de prioridade. Andei lendo o (excelente) blog do Fernando Meirelles (http://blogdeblindness.blogspot.com/), onde ele faz um relato sobre o seu trabalho atual, Blindness. Lá, ele escreve:

O que fazemos é montar a cena como se fosse teatro, sem pensar em câmeras e depois cobrimos o máximo possível. A decupagem acontece na sala de montagem, o que é uma vantagem, como tenho constatado, pois muitas vezes entre a imagem bem enquadrada da câmera A, que foi previamente planejada, ou a mesma cena meio encoberta da câmera B temos usado a segunda opção na montagem”.


Este trecho, assim isolado, pode dar a entender uma opção pelo improviso. Adiante no texto, entretanto, se esclarece que essa estratégia é também oriunda de método. As câmeras não estão dispostas aleatoriamente em volta da ação, existe uma organização. Uma câmera “garante a história”, isto é: ela é disposta de forma a permitir um entendimento íntegro da cena, servindo de salvaguarda para a compreensão da narrativa. Outra enquadra detalhes e não serve à história diretamente, mas está ali para gerar planos ousados, que acrescentam opções de montagem para a criação de efeitos intra-cena, ao mesmo tempo em que favorecem a uma manutenção de estilo. Uma terceira câmera, que ele chama de câmera-do-acaso, quase sempre não tem operador e fica disposta em algum canto do espaço cênico. O aproveitamento, segundo Meirelles, é baixo, mas eventualmente proporciona imagens inesperadas.


Para Meirelles, o filme enquanto encadeamento de planos só se forma, de fato, na sala de montagem. Como diretor, é claro, ele lida com áreas que precisam de maior dose de planejamento prévio: é notório o seu perfeccionismo no tocante à direção de atores, com muitos ensaios.


É um pouco assustador para alguém que faz parte da turma dos decupadores compulsivos pensar no efeito que esse tipo de declaração pode gerar. Nada contra Meirelles, pois o considero um dos melhores (se não o melhor) diretores brasileiros da atualidade. É que pouca gente vai ler essa ressalva que farei aqui: o método de trabalho de Meirelles é fruto de uma prática profílica e aprimorada, e que possui também um método e uma organização de trabalho. Não se trata de porra-louquice com câmeras bamboleantes. O seu modo de filmar tem muito a ver com o seu modo de contar histórias ─ a agilidade e imprecisão dos movimentos de câmera dá dinamismo a uma narrativa entrecortada e instigante, cuja organização denota, ao mesmo tempo, um conhecimento profundo da história e do aparato narrativo do cinema. Meirelles não é nenhum gênio, mas é um craque no que faz. A câmera frenética não é a panacéia dos novos diretores. Quando Meirelles começou, certamente também foi decupando, essa atividade chata e sem graça que dá coesão aos filmes de nós outros, diretores de cinema CDFs e desinspirados. Mas o cara é tão bacana que dá até uma colher de chá pra gente:


"Admiro a capacidade de abstração de diretores que conseguem pensar seus filmes de ponta a ponta com antecedência, diretores que desenham storyboards e depois cumprem à risca o que planejaram. Já tentei fazer isso, mas fico tão focado em fazer o que planejei que acabo não vendo as idéias vivas que acontecem no set. Já filmei muito como um clarinetista que toca seguindo uma partitura, hoje acho que filmo mais como jazz. Você me entende."

Valeu!

Anexo - contribuição do professor Roberto Duarte a um bloqueiro ranzinza e polemista:

"Master scenes significa exatamente o que Meirelles descreve no texto dele. Cada diretor. concretamente, aplica isso ao seu modo. Se você quer mesmo ter sempre a última palavra, aprenda essas:

- Sim, Senhor!
Abraços.
RD"

Tá, Roberto. Sim Senhor.


6 comentários:

Anônimo disse...

Voce tem algo a ver com isso?

http://cinema.terra.com.br/interna/0,,OI2017780-EI1176,00.html

hum ;)

Anônimo disse...

Links malditos

repito e transcrevo a piada:

Voce tem algo a ver com isso??:

Fernando Meirelles perde roteiro de 'Blindness

no http://cinema.terra.com.br

"O cineasta Fernando Meirelles afirmou, em seu blog, que perdeu o roteiro de Blindness, seu último longa. O mesmo já tinha acontecido quando ele trabalhava nos filmes Cidade de Deus e O Jardineiro Fiel.

Meirelles disse que poderia imprimir uma nova cópia do roteiro, mas que não seria a mesma coisa. "O que me faz falta não são os diálogos ou as descrições das cenas, mas sim as anotações e idéias que fui rabiscando nos cantos ou no verso das páginas desde dezembro do ano passado", escreveu ele.

O cineasta afirmou ter certeza de onde deixou o roteiro. "Estava na prateleira de livros no cenário da casa do Médico. Alguém tirou do cenário, provavelmente para não aparecer em quadro, enfiou numa caixa qualquer e eu nunca mais vou vê-lo, já sei".

"Agora tenho que terminar de rodar assim mesmo, às cegas. Já vi este filme", explicou."

ps: muito humor negro esse ultimo comentário!

um beijo
beth

Davi Lopes Ramos disse...

em breve, nos cinemas: "CEGUEIRA", um filme e idéia original de Davi Lopes Ramos rsrs

Davi Lopes Ramos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Iris de Oliveira disse...

como jazz! ca ra lho.

e tu, pra onde vai?
wow!
bj

Davi Lopes Ramos disse...

ainda prefiro o bom e velho trio: baixo, guitarra e bateria.