Alfred Hitchcock, um exímio estrategista de planos
Na feitura do filme, os diferentes departamentos precisam contribuir não só materialmente como também criativamente. Para efeito didático, falarei neste texto de três dos departamentos mais importantes (direção de arte, direção de fotografia e elenco), pois entender o funcionamento destes contribui para que se esclareça o modo como trabalham os demais.
Diretor de arte (e equipe) e diretor de fotografia (e equipe) estão em contato direto com a direção. O ideal é que entendam por dentro o projeto estético do diretor, para a partir daí pautarem seus trabalhos por uma idéia mestra, uma idéia diretriz. Desta forma, a arte procura ou produz objetos dentro da paleta de cores definida pelo diretor, ajudando a criar o “clima” programado para cada ambiente. Precisam saber, também, qual é o estilo de cada que devem seguir os cenários: que época deve representar, se o personagem é bagunceiro ou organizado, se é pobre ou rico etc.
É imprescindível uma leitura do roteiro e da decupagem (se um objeto entra em plano detalhe, por exemplo, precisa ser mais detalhado e não deve ser falseado). Estudando a decupagem, o diretor de arte fica sabendo o que vai entrar ou não em quadro, se poupando de trabalho inútil ao colocar no cenário objetos que simplesmente não vão aparecer. Ainda assim, jamais se afastará do crivo do diretor, levando a ele fotos com opções de móveis, roupas e tonalidades.
O diretor, em cada uma de suas escolhas, corrige possíveis desvios. Quando se afastam do diretor, a tendência é que a bússola dos chefes de departamento sofra um desvio natural. Cabe ao diretor, o responsável pelas relações estéticas e, em última instância, forjador da narrativa, a tarefa de realinhamento constante dos ponteiros.
Acontece, também, de se encontrar coisas muitos interessantes entre as sugestões, e que não estavam no planejamento inicial. Como conhece o filme em seu conjunto, o diretor pode com segurança agregar determinado valor ou objeto a seu projeto estético, pois conhece previamente as relações que este elemento estabelecerá com todos os outros.
Já para o diretor de fotografia o ideal é que participe ativamente do processo de decupagem do filme, dando sugestões, apontando erros e sinalizando planos especialmente problemáticos. Esta análise diz muito sobre o tempo necessário para preparar cada cena, e é fundamental para a elaboração da ordem do dia por parte do assistente de direção.
Cabe ao diretor de fotografia gerenciar os meios materiais para executar o programa de imagens concebido pelo diretor, em um trabalho de intensa colaboração . Assim, pode aplicar sua experiência e senso crítico no conjunto da obra, sugerindo novos enquadramentos, jogos de luz etc. Essas sugestões, no entanto, deverão sempre passar pelo avaliação do diretor, que dispõe de um número maior de informações a respeito do filme a ser realizado.
Na atuação o processo é semelhante, com a exceção de que, por estarem em constante exposição, o diretor precisa ter um cuidado maior com a disposição emocional e o conforto dos atores. Não é recomendável que eles conheçam a decupagem, pois, se assim fosse, poderiam ficar travados demais pensando no resultado final da cena. Ou pior: utilizariam o acesso privilegiado ao diretor para pedir mudanças de enquadramento que os privilegiassem, além de outros problemas.
O trabalho com o ator se utiliza mais de uma indução continuada, ensaio a ensaio, take a take, do que de um processo informativo, como o é com as outras equipes. Ainda que o ator coloque no personagem toda a sua carga emocional, também é o diretor quem decide se determinado tom está adequado ou não ao filme. O material humano do ator deve coadunar-se ao projeto em seu todo, e é o diretor quem vai direciona-lo até este ponto.
O diretor é um executor de planos, sua função é garantir as imagens e sons que melhor contem a sua história, mantendo unidade estética e dramática, criando progressões emocionais ritmadas e levando adiante, no mesmo passo, direção de arte, fotografia, atuação e outros departamentos. É ele o responsável pela junção de todos materiais, sejam eles técnicos ou humanos.
O material criativo não deixa de ser um material: ainda que ouça muitas sugestões e opiniões, cada uma dessas precisa, primeiro, passar por uma avaliação hipotética, mental, que só o diretor pode fazer, que preveja as relações que determinado elemento aventado pela equipe se harmonize com o todo, e de preferência o reforce e enriqueça. Não raro, uma sugestão que é feita com uma intenção ganha, nesta etapa, função diferente, mais ou menos poderosa, na hora da execução.
Virou lugar comum dizer que “o cinema é uma criação coletiva”. A frase parece ter um lugar de destaque no discurso dos que estudam cinema, mas seria difícil ouvi-lo daqueles que o fazem. Em um set, muitas pessoas podem falar e sugerir, e algumas vezes com muita razão. Mas somente o diretor pode dizer com certeza.
Existem filmes de direção coletiva. Como exemplos, posso citar o September 11 (um filme, 11 histórias, onze diretores), e Paris, je t'aime (um filme, 21 histórias, 22 diretores). São obras com muitos segmentos, e cada segmento com o seu diretor. Provavelmente o único modo são de se produzir um filme coletivo. Como alternativa, o que existe, é o caos da não direção, muito comum em equipes iniciantes, em que vigora a idéia de que uma pessoa só dirigir é uma coisa muito arrogante etc, e que várias cabeças pensam melhor do que uma. Isso pode ser verdade com relação ao ato de pensar. Não é verdade com relação ao ato de dirigir um filme.
Seria mais correto dizer que o cinema é uma prática coletiva que uma criação coletiva, pois o é assim como a arquitetura: o projeto, definido pela mente diretiva, guia um árduo trabalho intelectual e criativo por parte de engenheiros (que avaliam condições de solo, materiais a serem usados etc), e um árduo trabalho braçal (e quiçá criativo...) por parte de mestres de obras, pedreiros, pintores etc. Mas isso não faz do arquiteto menos diretor de sua obra.
A criatividade é o material humano que contribui para a realização de seu projeto, sem deturpá-lo em um único milímetro. Esse é, aliás, o ponto ideal para qualquer técnico: que seu trabalho, de tão bom, se torne invisível. Com cinema é a mesma coisa.
ps: ao terminar de escrever, sinto que não falei nada de mais e não fui além dos lugares comuns. Mas acho importante, ainda assim, que esse tipo de informação seja divulgada, pois esses são lugares comuns que eu vejo frequentemente esquecidos ou ignorados.
Na feitura do filme, os diferentes departamentos precisam contribuir não só materialmente como também criativamente. Para efeito didático, falarei neste texto de três dos departamentos mais importantes (direção de arte, direção de fotografia e elenco), pois entender o funcionamento destes contribui para que se esclareça o modo como trabalham os demais.
Diretor de arte (e equipe) e diretor de fotografia (e equipe) estão em contato direto com a direção. O ideal é que entendam por dentro o projeto estético do diretor, para a partir daí pautarem seus trabalhos por uma idéia mestra, uma idéia diretriz. Desta forma, a arte procura ou produz objetos dentro da paleta de cores definida pelo diretor, ajudando a criar o “clima” programado para cada ambiente. Precisam saber, também, qual é o estilo de cada que devem seguir os cenários: que época deve representar, se o personagem é bagunceiro ou organizado, se é pobre ou rico etc.
É imprescindível uma leitura do roteiro e da decupagem (se um objeto entra em plano detalhe, por exemplo, precisa ser mais detalhado e não deve ser falseado). Estudando a decupagem, o diretor de arte fica sabendo o que vai entrar ou não em quadro, se poupando de trabalho inútil ao colocar no cenário objetos que simplesmente não vão aparecer. Ainda assim, jamais se afastará do crivo do diretor, levando a ele fotos com opções de móveis, roupas e tonalidades.
O diretor, em cada uma de suas escolhas, corrige possíveis desvios. Quando se afastam do diretor, a tendência é que a bússola dos chefes de departamento sofra um desvio natural. Cabe ao diretor, o responsável pelas relações estéticas e, em última instância, forjador da narrativa, a tarefa de realinhamento constante dos ponteiros.
Acontece, também, de se encontrar coisas muitos interessantes entre as sugestões, e que não estavam no planejamento inicial. Como conhece o filme em seu conjunto, o diretor pode com segurança agregar determinado valor ou objeto a seu projeto estético, pois conhece previamente as relações que este elemento estabelecerá com todos os outros.
Já para o diretor de fotografia o ideal é que participe ativamente do processo de decupagem do filme, dando sugestões, apontando erros e sinalizando planos especialmente problemáticos. Esta análise diz muito sobre o tempo necessário para preparar cada cena, e é fundamental para a elaboração da ordem do dia por parte do assistente de direção.
Cabe ao diretor de fotografia gerenciar os meios materiais para executar o programa de imagens concebido pelo diretor, em um trabalho de intensa colaboração . Assim, pode aplicar sua experiência e senso crítico no conjunto da obra, sugerindo novos enquadramentos, jogos de luz etc. Essas sugestões, no entanto, deverão sempre passar pelo avaliação do diretor, que dispõe de um número maior de informações a respeito do filme a ser realizado.
Na atuação o processo é semelhante, com a exceção de que, por estarem em constante exposição, o diretor precisa ter um cuidado maior com a disposição emocional e o conforto dos atores. Não é recomendável que eles conheçam a decupagem, pois, se assim fosse, poderiam ficar travados demais pensando no resultado final da cena. Ou pior: utilizariam o acesso privilegiado ao diretor para pedir mudanças de enquadramento que os privilegiassem, além de outros problemas.
O trabalho com o ator se utiliza mais de uma indução continuada, ensaio a ensaio, take a take, do que de um processo informativo, como o é com as outras equipes. Ainda que o ator coloque no personagem toda a sua carga emocional, também é o diretor quem decide se determinado tom está adequado ou não ao filme. O material humano do ator deve coadunar-se ao projeto em seu todo, e é o diretor quem vai direciona-lo até este ponto.
O diretor é um executor de planos, sua função é garantir as imagens e sons que melhor contem a sua história, mantendo unidade estética e dramática, criando progressões emocionais ritmadas e levando adiante, no mesmo passo, direção de arte, fotografia, atuação e outros departamentos. É ele o responsável pela junção de todos materiais, sejam eles técnicos ou humanos.
O material criativo não deixa de ser um material: ainda que ouça muitas sugestões e opiniões, cada uma dessas precisa, primeiro, passar por uma avaliação hipotética, mental, que só o diretor pode fazer, que preveja as relações que determinado elemento aventado pela equipe se harmonize com o todo, e de preferência o reforce e enriqueça. Não raro, uma sugestão que é feita com uma intenção ganha, nesta etapa, função diferente, mais ou menos poderosa, na hora da execução.
Virou lugar comum dizer que “o cinema é uma criação coletiva”. A frase parece ter um lugar de destaque no discurso dos que estudam cinema, mas seria difícil ouvi-lo daqueles que o fazem. Em um set, muitas pessoas podem falar e sugerir, e algumas vezes com muita razão. Mas somente o diretor pode dizer com certeza.
Existem filmes de direção coletiva. Como exemplos, posso citar o September 11 (um filme, 11 histórias, onze diretores), e Paris, je t'aime (um filme, 21 histórias, 22 diretores). São obras com muitos segmentos, e cada segmento com o seu diretor. Provavelmente o único modo são de se produzir um filme coletivo. Como alternativa, o que existe, é o caos da não direção, muito comum em equipes iniciantes, em que vigora a idéia de que uma pessoa só dirigir é uma coisa muito arrogante etc, e que várias cabeças pensam melhor do que uma. Isso pode ser verdade com relação ao ato de pensar. Não é verdade com relação ao ato de dirigir um filme.
Seria mais correto dizer que o cinema é uma prática coletiva que uma criação coletiva, pois o é assim como a arquitetura: o projeto, definido pela mente diretiva, guia um árduo trabalho intelectual e criativo por parte de engenheiros (que avaliam condições de solo, materiais a serem usados etc), e um árduo trabalho braçal (e quiçá criativo...) por parte de mestres de obras, pedreiros, pintores etc. Mas isso não faz do arquiteto menos diretor de sua obra.
A criatividade é o material humano que contribui para a realização de seu projeto, sem deturpá-lo em um único milímetro. Esse é, aliás, o ponto ideal para qualquer técnico: que seu trabalho, de tão bom, se torne invisível. Com cinema é a mesma coisa.
ps: ao terminar de escrever, sinto que não falei nada de mais e não fui além dos lugares comuns. Mas acho importante, ainda assim, que esse tipo de informação seja divulgada, pois esses são lugares comuns que eu vejo frequentemente esquecidos ou ignorados.
3 comentários:
a fala de um diretor nato!
beijo
Olá,
Não me esqueci do seu texto sobre originalidade não, viu!
Só estou esperando fluir tamanha inspiração para falar sobre o assunto também. Ando sem tempo para "filosofar" ultimamente.rs
mas coninuo visitando seu blog e lendo seus textos interessantes.
Té mais!
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